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SERIE MEU RECIFE

Cotovia

 

 

— Alô, cotovia!

Aonde voaste,

Por onde andaste,

Que saudades me deixaste?

 

 

— Andei onde deu o vento.

Onde foi meu pensamento

Em sítios, que nunca viste,

De um país que não existe . . .

Voltei, te trouxe a alegria.

 

 

— Muito contas, cotovia!

E que outras terras distantes

Visitaste? Dize ao triste.

 

 

— Líbia ardente, Cítia fria,

Europa, França, Bahia . . .

 

 

— E esqueceste Pernambuco,

Distraída?

 

 

— Voei ao Recife, no Cais

Pousei na Rua da Aurora.

 

 

— Aurora da minha vida

Que os anos não trazem mais!

 

 

— Os anos não, nem os dias,

Que isso cabe às cotovias.

Meu bico é bem pequenino

Para o bem que é deste mundo:

Se enche com uma gota de água.

Mas sei torcer o destino,

Sei no espaço de um segundo

Limpar o pesar mais fundo.

Voei ao Recife, e dos longes

Das distâncias, aonde alcança

Só a asa da cotovia,

— Do mais remoto e perempto

Dos teus dias de criança

Te trouxe a extinta esperança,

Trouxe a perdida alegria.

 

(MANUEL BANDEIRA)

 

 

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Uploaded on October 3, 2006
Taken on October 2, 2006